Voltar
-
01/06/2015

Guantánamo: Problema de todos

Símbolo de desrespeito aos direitos humanos, prisão americana é tema de debate em São Paulo

Para Jessica Morris, da Conectas, Guantánamos é um 'buraco negro jurídico' Para Jessica Morris, da Conectas, Guantánamos é um 'buraco negro jurídico'

Apesar de ter sido criada e mantida pelo governo americano como resposta aos atentados de 11/9, a existência da prisão americana de Guantánamo é um problema internacional e suas soluções exigem comprometimento global – sobretudo através do reassentamento dos 57 detentos que já estão aptos para transferência. Essa foi uma das conclusões do debate “EUA e tortura: de Guantánamo às prisões secretas da CIA”, realizado na quarta-feira (27/5) em São Paulo como parte da programação do XIV Colóquio Internacional de Direitos Humanos.

“É uma afronta ao sistema internacional de direitos humanos”, afirmou Jessica Carvalho Morris, nova diretora Executiva da Conectas. “Criou-se um buraco negro jurídico.” Polly Rossdale, da organização Reprieve, deu exemplos concretos de como esse limbo normativo permitiu a continuidade das violações no presídio. Ela, que coordenou o reassentamento de 30 ex-detentos nos últimos seis anos, citou o caso do estudante iemenita Emad Hassan, preso no Paquistão. “Os Estados Unidos estavam pagando recompensas para quem fizesse denúncias. Essa era a chamada ‘inteligência’. Cerca de 86% dos homens presos em Guantánamo não foram capturados pelo exército americano, mas por terceiras pessoas”, explica.

Emad está em greve de fome há oito anos e já perdeu 43 kg. Ele e outros 48 iemenitas já estão aptos para libertação, mas, por imposição do governo americano – que afirma que o Iêmen não é suficientemente seguro para recebê-los de volta –, dependem da possibilidade de reassentamento em outros países. “Acredito que as nações latino-americanas têm um importante papel na ajuda para acabar com essa tragédia”, afirmou.

“Mas por que países como o Brasil deveriam se importar?”, indagou Jamil Dakwar, da ACLU (American Civil Liberties Union). Segundo ele, porque o problema não só a existência da prisão, mas a exportação desse modelo – e seu impacto na defesa global dos direitos humanos. “Se os Estados Unidos, uma das mais celebradas democracias do mundo, pode criar um marco legal que permita a existência de Guantánamo, porque outros países não poderiam?”

Gastón Chillier, diretor Executivo do Cels (Centro de Estudios Legales y Sociales, da Argentina), chama atenção para outra consequência de Guantánamo e da prática sistemática de tortura por parte da CIA, a agência de inteligência americana: a fragilização da legalidade internacional, do consenso construído pelos países ao redor da proibição da tortura e do dever de investigar violações.

Mencionando os avanços ocorridos na América Latina no sentido da reconstrução da memória e da verdade, afirmou que a tortura e a desaparição forçada não são novas nem foram inventadas pelos Estados Unidos. “A diferença – e esse é o ponto central para o movimento de direitos humanos – é que, em nossos países, essas práticas foram cometidas por governos autoritários ou em contextos de conflito armado de maneira clandestina”, afirmou. “Temos a responsabilidade de gerar as condições para que haja uma prestação de contas pelos crimes cometidos pelos Estados Unidos. O desafio é imenso, mas temos de estar a altura dele.”

Informe-se

Receba por e-mail as atualizações da Conectas