No final de 2019, a entidade católica Centro Dom Bosco de Fé e Cultura acionou a Justiça para impedir a exibição do especial de final de ano da produtora humorística Porta dos Fundos. De acordo com a associação, o programa “A Primeira Tentação de Cristo”, disponível no serviço de streaming Netflix, representa um “ataque” ao “conjunto de crenças e valores que cercam a figura do Cristo”. 

O argumento foi acolhido por um desembargador do Rio de Janeiro, que censurou o conteúdo e toda a publicidade relacionada a ele. A Netflix questionou as decisões através de uma Reclamação (RCL 38782) ao STF (Supremo Tribunal Federal) e de um pedido liminar para garantir a exibição do programa, que foi acolhido em janeiro de 2020 .

A Conectas apresentou pedido de ingresso como amicus curiae e, em sua contribuição, sustenta que o especial de final de ano não viola a liberdade de crença, e que a manutenção da censura teria impactos inestimáveis na liberdade de expressão e no direito dos usuários dos serviços da Netflix de acessar o conteúdo. 

A manifestação da entidade traz um caso emblemático envolvendo o filme “A Última Tentação de Cristo”, de Martin Scorsese, e o Estado chileno, que vetou a sua exibição. Após uma decisão da Suprema Corte chilena no sentido de manter a censura, o país foi condenado na Corte Interamericana de Direitos Humanos por violar a liberdade de expressão e pensamento. 

A Conectas recupera, ainda, um informe do Relator Especial da ONU sobre

Liberdade de Religião e de Crença, Ahmed Shaheed, para quem a discriminação religiosa “também pode ocorrer quando o gozo de outros direitos fundamentais por parte de um indivíduo – por exemplo, o direito à saúde, educação, expressão, reunião pacífica – é restringido ou interferido por atores estatais ou não estatais em nome da religião ou com base na religião ou crença de uma pessoa”.

Em novembro de 2020, a segunda turma do STF decidiu pela cassação definitiva das decisões judiciais anteriores e garantiu a permanência do programa no catálogo da Netflix.


Ficha técnica

  • Ação: Reclamação 38782
  • Instância: STF (Supremo Tribunal Federal)
  • Status: O caso foi encerrado com o fim da censura ao programa
  • Tramitação:
    • 9/1/20: Pedido liminar é acolhido pelo STF e a censura, suspensa
    • 12/2/20: Pedido de ingresso como amicus curiae
    • 3/11/20: Segunda turma derruba definitivamente as duas decisões da Justiça do Rio de Janeiro