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09/02/2023

STF decide se crimes cometidos por militares devem ser processados pela Justiça Civil

Para organizações de direitos humanos, a Justiça Militar no Brasil não oferece condições para atender às demandas de responsabilização de militares por crimes cometidos contra civis

As competências da Justiça Militar em julgar civis e agentes das Forças Armadas que cometem crimes contra a vida são algumas questões em pauta no STF (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil) As competências da Justiça Militar em julgar civis e agentes das Forças Armadas que cometem crimes contra a vida são algumas questões em pauta no STF (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

O STF (Supremo Tribunal Federal) volta a analisar, nesta sexta-feira (10), se agentes das Forças Armadas que cometem crimes contra civis em atividades de segurança pública devem ser julgados pela Justiça Comum.

A discussão está no âmbito da ADI 5032 (Ação Direta de Inconstitucionalidade), apresentada, em 2013, pela PGR (Procuradoria Geral da República). A ação, portanto, pede que a Suprema Corte considere inconstitucionais trechos de uma legislação (Lei Complementar nº 136/2010) que aumenta a competência da Justiça Militar, permitindo que os próprios militares julguem colegas causadores de crimes contra a vida de civis.

Em dezembro de 2022, a ação chegou a ser incluída na pauta de julgamento virtual, mas foi retirada após pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski. Agora, o caso será colocado novamente no plenário virtual da Corte. Deste modo, os ministros e as ministras podem publicar seus votos entre os dias 10 e 17 de fevereiro. Até o momento, o julgamento está com quatro votos: três deles pela improcedência da ação e um voto divergente. 

Conectas, assim como Tortura Nunca Mais, Defensoria Pública da União e Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, foram admitidos como amicus curie na ADI 5032. Para as organizações de direitos humanos e a Defensoria Pública, em uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem), por exemplo, não há órgão de polícia judiciária pré-determinado e existe uma ineficiência da administração do sistema de apuração e responsabilização dos militares pela prática de atos ilícitos.

As organizações especializadas em direitos humanos e no enfrentamento à violência institucional ressaltam também que se um militar praticar o crime de tortura contra uma pessoa civil durante uma operação do Exército, ele deve ser investigado e processado pela Justiça Comum, dentro de uma ação independente. Entende-se que a extensão da competência da Justiça Militar para julgar essas situações coloca o Brasil como um violador de suas próprias leis e de tratados internacionais de direitos humanos. 

“A Justiça Militar no Brasil não oferece condições para atender às demandas de responsabilização de militares por crimes cometidos contra civis. Não há estrutura de atendimento às vítimas, nem de apuração independente, além disso, seus órgãos colegiados são majoritariamente compostos por militares que, sem formação jurídica, zelam pela hierarquia e disciplina militar, o que reforça sua legitimidade restrita a decidir sobre crimes funcionais e não condutas e crimes comuns praticados contra civis, como os de abuso de autoridade, tortura, homicidio, entre outros”, afirma Gabriel Sampaio, diretor de Incidência e Litigância da Conectas. Pelo menos seis ações que estão tramitando no STF pedem que sejam estabelecidos limites constitucionais à jurisdição militar brasileira.

Normativa baiana 

Na Bahia, por exemplo, o entendimento vigente do STF foi utilizado para editar uma instrução normativa conjunta (nº 01/2019) sobre a investigação de crimes dolosos contra a vida cometidos por agentes públicos contra civis. Este texto “dificulta a apuração, identificação e responsabilização de crimes dolosos contra a vida de civis cometidos por policiais militares”, avalia Wagner Moreira, articulador do Fórum Popular de Segurança Pública do Nordeste.

Artigos desta instrução restringem a atribuição investigativa da Polícia Civil, estabelecendo que, em casos de homicídios ou lesões provocadas por policiais militares contra civis, a abertura de inquérito na Polícia Civil estará condicionada ao requerimento do Ministério Público, Secretário de Segurança Pública ou Delegado Geral da Polícia Civil. Assim, há restrições à apuração de mortes de civis causadas por policiais militares, ao arrepio das normas constitucionais. O Estado da Bahia detém o 5º maior índice de letalidade policial do país, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022.

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