Ao abrir a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, o presidente Jair Bolsonaro fez nesta terça-feira, 24, um discurso agressivo contra direitos indígenas, ONGs, imprensa e outros países.
O mais importante espaço de debates das Nações Unidas foi utilizado pelo mandatário como palco para a propagação de uma visão distorcida e paternalista sobre as populações indígenas e, diante de todas as nações do mundo, declarou o encerramento do processo de demarcação de terras.
“Quero deixar claro: o Brasil não vai aumentar para 20% sua área já demarcada como terra indígena, como alguns chefes de Estados gostariam que acontecesse”, declarou o presidente. “Infelizmente, algumas pessoas, de dentro e de fora do Brasil, apoiadas em ONGs, teimam em tratar e manter nossos índios como verdadeiros homens das cavernas.”
Bolsonaro atacou ainda a liderança histórica Raoni Metuktire, da etnia Caiapó, reconhecido mundialmente pela sua luta em defesa dos povos tradicionais e da defesa da Amazônia e criticou a demarcação das terras indígenas Yanomami e Raposa Serra do Sol, homologadas em 1992 e 2005, respectivamente.
“Muitas vezes alguns desses líderes, como o Cacique Raoni, são usados como peça de manobra por governos estrangeiros na sua guerra informacional para avançar seus interesses na Amazônia”, afirmou Bolsonaro, que incluiu a youtuber indígena Ysany Kalapalo em sua comitiva para respaldar a política indígena brasileira. “O índio não quer ser latifundiário pobre em cima de terras ricas. Especialmente das terras mais ricas do mundo. É o caso das reservas Ianomâmi e Raposa Serra do Sol. Nessas reservas, existe grande abundância de ouro, diamante, urânio, nióbio e terras raras, entre outros”, complementa.
De acordo com Camila Asano, coordenadora de programas da Conectas Direitos Humanos, Bolsonaro distorce argumentos sobre a autonomia dos povos originários para negar direitos que a própria Constituição garante.
“Contrariando a Constituição, o presidente afirma categoricamente que não promoverá novas demarcações de terras indígenas”, afirma Asano. “Além disso, é extremamente grave que o presidente tenha usado a Assembleia Geral da ONU como palanque para atacar uma liderança indígena e ameaçar a segurança jurídica das terras Yanomami e Raposa Serra do Sol.”
A inclusão da Kalapalo na delegação brasileira provocou protestos de lideranças de catorze povos do Xingu por desrespeitar a “autonomia própria das organizações dos povos indígenas de decisão e indicação de seus representantes”.
Política do isolacionismo
Na tentativa de recuperar a imagem internacional do Brasil após as queimadas na Amazônia, o presidente atacou a imprensa e classificou como mentirosa e sensacionalista a cobertura de veículos internacionais a respeito.
Na contramão do espírito multilateral, Bolsonaro abandonou o decoro diplomático, vociferou ataques à Cuba e à Venezuela e teceu diversas insinuações à França e outros países europeus, isolando o Brasil ainda mais no cenário político.
“O ‘novo Brasil’ anunciado por Bolsonaro em seu discurso é retrógrado, preso a uma lógica anacrônica da Guerra Fria e a uma visão fundamentalista sobre gênero e sexualidade”, declarou Asano. “Se seu objetivo era reconquistar a confiança do mundo, como dito na abertura de seu discurso, o resultado foi arranhar ainda mais a credibilidade internacional do Brasil”, finaliza.