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27/03/2013

Cúpula dos Brics termina com avanço sobre a Síria e incertezas sobre novo banco

De Durban, Conectas comenta ponto a ponto o resultado do encontro de chefes de Estado



A cúpula dos Brics – Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul – terminou hoje em Durban com uma declaração conjunta que foi recebida como sinal de avanço em temas críticos como o conflito na síria, mas também com preocupação diante de como o novo banco de desenvolvimento, anunciado pelo bloco, será constituído, sobretudo com relação a critérios de transparência e respeito aos direitos humanos pelos projetos financiados pela futura instituição.

Conectas esteve presente em Durban durante a cúpula e trabalhou especialmente sobre cinco pontos relacionados aos direitos humanos. O endosso coletivo ‘à entrada de ajuda humanitária na Síria, foi um dos temas mais importantes. Neste ponto, a declaração foi considerada satisfatória, mas a organização lembrou que “se trata do mínimo obrigatório” e que, agora, precisa ser posta em prática.

O ponto negativo foi a ausência de critérios de transparência e respeito aos direitos humanos nas bases de fundação do novo Banco dos Brics, que financiará sobretudo grandes projetos de infraestrutura, com alto potencial de violação, especialmente na África, continente visto por construtoras e mineradoras como pouco regulado e rico em oportunidades de negócio.

Ouça a avaliação feita pela coordenadora de Política Externa da Conectas, Camila Asano, minutos depois do encerramento da cúpula.

Veja os comentários da Conectas para pontos relevantes da agenda internacional de direitos humanos que esperava-se que fossem tratados na Cúpula:

1. Proteção internacional dos direitos humanos

Nesta declaração, diferente das anteriores, há um parágrafo exclusivo dedicado aos direitos humanos.( 23. Saudamos o vigésimo aniversário da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos e da Declaração e Programa de Ação de Viena, e concordamos em explorar a cooperação no campo de direitos humanos.)

Conectas pontou que “a cooperação em direitos humanos é necessária, é bem-vinda, mas deve ser de verdade, não apenas uma intenção expressa na carta.” Exemplo disso é a necessidade urgente de que os cinco membros do bloco ratifiquem os 9 principais tratados de direitos humanos.

2. Banco BRICS

Para a Conectas, “o anúncio da criação do Banco de Desenvolvimento dos Brics não foi acompanhado de anúncio que a futura instituição financeira contemplará critérios mínimos de transparência e de mecanismos para garantia de que os projetos a serem financiados não promovam violações aos direitos humanos. Esses são pontos cruciais e que devem constar nas negociações do estabelecimento do novo banco”.

Conectas participou de atividade organizada pelo Instituto Mais Democracia e Fundacao Henrich Boll no evento paralelo da sociedade civil chamado Brics from Below (BRICS Vindo de Baixo), sobre monitoramento da sociedade civil desse banco. Na ocasião, foi claramente colocado que esta era uma oportunidade única de se poder influenciar o processo de construção de um banco, o que não ocorreu quando da criação do Banco Mundial e do FMI (Fundo Monetário Internacional), por exemplo.

3. Síria

O texto da declaração diz: “Tendo em vista a deterioração da situação humanitária na Síria, solicitamos que todas as partes permitam e possibilitem o acesso imediato, seguro, completo e sem restrições para as organizações humanitárias atenderem todos aqueles que precisam de ajuda. Pedimos que todas as partes garantam a segurança das equipes humanitárias (em tradução livre do texto original da declaração)”.

“O pedido por acesso irrestrito para entrada de ajuda humanitária na Síria atende a uma necessidade urgente. Assistência a vitimas de um conflito tão cruel como o sírio é o mínimo a ser cobrado pela comunidade internacional, sequer deveria ser elemento de negociação e, muito menos, de barganha. Agora, a Declaração deve se traduzir em ação. Conectas espera que Brasil cobre imediatamente das autoridades sírias o acesso imediato, irrestrito e seguro às organizações humanitárias na Síria”, disse Camila.

4. Tratado sobre Comércio de Armas

O Tratado sobre Comércio de Armas (ATT, na sigla em inglês) foi deixado de fora da Declaração do BRICS. China e Rússia, membros do grupo, vêm tendo um papel ativo contra a adoção de um documento firme na conferência sobre o Tratado que termina amanhã (28/03), em Nova Iorque. Já os demais membros do BRICS, Índia, Brasil e África do Sul, têm deixado a desejar nas negociações e não aderiram a um pronunciamento conjunto assinado por 103 países solicitando um documento mais robusto.

Hoje (27/03), foi publicado novo texto do Tratado, que apresenta graves problemas, entre estes os direitos humanos não são contemplados como um critério à proibição de transferência de armas. Ainda não se sabe se o primeiro instrumento internacional para regular o comércio de armas no mundo vai ser adotado, dada a necessidade de consenso entre os 193 países da ONU.

5. Sociedade civil

Foi anunciada a criação do Conselho de Think Tanks e Conselho Empresarial dos BRICS. Mas ainda não há nada sobre espaços formais para sociedade civil.

A iniciativa Brics from Below (BRICS Vindo de Baixo), da qual Conectas participou, foi paralela ao encontro oficial e mostra que sociedade civil de Brasil, Rússia, Índia, China e ‘África do Sul está vigilante aos temas que os 5 países estavam discutindo e negociando.

A próxima cúpula será no Brasil, em 2014. Como anfitrião, o País terá papel fundamental na redação da declaração. Concluida a edição em Durban, os olhos já se voltam ao Brasil. Como parte dos esforços preparativos e atendendo a demanda por uma politica externa mais aberta e transparente, o governo brasileiro deveria começar desde já a realizar consultas à sociedade civil ao longo do processo de definição do tema e da agenda da próxima reunião.

Cartaz da campanha lançada pela Conectas na véspera do encontro:

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