O STF (Supremo Tribunal Federal) analisa um habeas corpus (HC  208240) com dimensão coletiva sobre abordagens policiais feitas sem critérios objetivos ou baseadas apenas na cor da pele, o chamado perfilamento racial. Para reforçar a análise dos ministros, oito organizações de direitos humanos protocolaram um memorial com petição argumentando que a prática, da forma como acontece hoje, é discriminatória.

Coalizão Negra por Direitos, Conectas, Educafro Brasil, Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Instituto de Referência Negra Peregum, ITTC (Instituto Terra Trabalho e Cidadania) e Plataforma JUSTA pedem aos magistrados que reconheçam a inexistência do crime diante da ilegalidade de provas derivadas de busca pessoal realizada com base em filtragem racial.

A origem do pedido diz respeito a um habeas corpus apresentado pela Defensoria Pública de São Paulo sobre o caso específico de um crime com provas derivadas de busca por agentes do Estado justificada exclusivamente pela chamada ‘fundada suspeita’, conceito vago que abre espaço inclusive para que critérios racistas sejam usados na seleção de quem será abordado nas ruas. No documento, o grupo destaca que o réu, condenado em primeira instância e no STJ por tráfico ao portar 1,53 gramas de droga, foi abordado e revistado pelos policiais porque era negro. “E não estamos diante de algo que o Judiciário depois supôs, mas que foi antes confessado pelos próprios agentes policiais”, reforça o texto.

As organizações foram incluídas no processo como amici curiae (amigos da corte) pelo relator do caso, ministro Edson Fachin, e lembram que, apesar de partir de um caso individual, a discussão tem dimensão coletiva. “Isso porque tem como escopo enfrentar a violação sistemática e estrutural de direitos fundamentais que ocorre por meio do uso de perfis raciais na abordagem policial e na privação de liberdade”, principalmente de pessoas negras. Com isso, agentes do Estado reproduzem racismo institucional que evidencia uma estrutura de manutenção das desigualdades ancoradas em hierarquias raciais.

De acordo com a Organização das Nações Unidas, o perfilamento racial é “o uso pela polícia, profissionais de segurança e controle das fronteiras no uso da raça, cor, descendência, etnicidade ou nacionalidade de uma pessoa como parâmetro para submetê-la a buscas pessoais minuciosas, verificações de identidade e investigações”. A própria ONU identificou em um relatório publicado em 2020 que, no Brasil, há “uma sobre-representação de brasileiros afrodescendentes no sistema carcerário, e uma cultura de perfilamento e discriminação racial em todos os níveis do sistema de justiça”.

Em abril de 2024, o STF voltou a analisar o caso. Por sete votos a três, o plenário da Corte negou o HC para a pessoa presa com apenas 1,53 g de cocaína.  O Tribunal, por maioria, denegou a ordem, vencidos os Ministros Edson Fachin (Relator), Luiz Fux e Luís Roberto Barroso (Presidente). Em seguida, por unanimidade, foi fixada a seguinte tese de julgamento: “A busca pessoal independente de mandado judicial deve estar fundada em elementos indiciários objetivos de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, não sendo lícita a realização da medida com base na raça, sexo, orientação sexual, cor da pele ou aparência física”. 

Ficha técnica:

  • Ação, : Habeas Corpus 208240
  • Instância: STF
  • Status: Julgado
  • Tramitação: 
    • Protocolada em 26/10/2021
    • Pedido de amici curiae de entidades civis aceito – 11/11/2022
    • Início do julgamento – 01/03/2023
    • Suspenso o julgamento – 02/03/2023
    • Retomada do julgamento – 11/04/2024