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11/11/2020

Representatividade importa! Mas o que isso realmente significa?

A norma heterossexual branca masculina influencia a percepção de toda a sociedade.



Quando a atriz chilena Daniela Vega subiu ao palco, na cerimônia do Oscar de 2018, ela ajudou a reverter um equívoco histórico cristalizado pelos filmes de Hollywood: o de que mulheres trans são homens. Dar a pessoas cis o papel de personagens trans parece ser como um rito de amadurecimento na indústria do cinema, ao provar a capacidade dos atores de se metamorfosear. O problema é como isso influencia a percepção da sociedade. 

“[No Oscar 2014] Eu me lembro de ver Jared Leto de smoking branco e barba cheia [recebendo o prêmio]. Era muito claro para mim, naquele momento, que o mundo o via como um homem, apesar de Rayon [personagem trans] ter sido retratada com beleza e sensibilidade no filme ‘Clube de Compra de Dallas’”, lembra a atriz e roteirista Jen Richardson, no documentário “Revelação”, que discute a importância da representatividade trans.

“Percebi que isso faz parte de algo maior. O público pensa em mulheres trans como homens com cabelos bonitos, usando maquiagem e fantasia. E isso é reforçado toda vez que vemos um homem que interpretou uma mulher trans fora da tela.”

Mas, afinal, qual é a importância da representatividade? 

Ao se tornar a primeira mulher trans a apresentar uma das categorias do Oscar e a fazer parte da equipe vencedora do melhor filme estrangeiro, Daniela Vega mostrou que mulheres trans e travestis existem. E isso é só uma gota no oceano de reivindicações de pessoas que lutam pelo direito básico de poderem viver.

No Brasil, de acordo com a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), por exemplo, só entre os dois primeiros meses de 2020, o país teve um aumento de 90% nos casos de assassinatos dessa parte da população, em relação ao mesmo período do ano passado. 

A baixa representatividade trans na mídia reflete a baixa representatividade trans na política, nos negócios e nos lugares de tomadas de decisões no geral, o que ajuda a formar um ciclo vicioso de marginalização, mantido por pessoas que não têm urgência em mudar um cenário que as favorece. Mas o problema se estende por toda população que foge da norma heterossexual branca masculina. 

Segundo dados do Movimento Mulheres Negras, por exemplo, o número de mulheres negras eleitas nas eleições municipais, em 2016, não chegou a 5% — um paradoxo considerando que elas representam 27,8% da população. No caso das populações originárias, a situação se agrava, já que a única (e primeira mulher) representante indígena no Congresso Nacional é a advogada Joênia Wapichana (Rede), eleita deputada federal pelo estado de Roraima, em 2018.

Para a mestre em filosofia política Djamila Ribeiro, ao construirmos um imaginário de violência associado a grupos que não ocupam os lugares de poder, além de invisibilizá-los afetando a sua subjetividade e autoestima, oferecemos a justificativa necessária para exterminá-los sem remorso.

Em um vídeo da editora Boitempo, ela afirma: “Quando falamos de representação falamos, sobretudo, dessas imagens que foram construídas para nos colocar como não humanos e nos alçar a uma condição total de marginalidade”. A representatividade é, portanto, uma questão de sobrevivência

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