Voltar
-
01/12/2021

Câmara quer acelerar votação de projeto de lei que cria “polícia política” de Bolsonaro

De cunho autoritário, proposta da base governista estabelece um sistema de vigilância paralelo sob controle do presidente da República e cria mecanismos de perseguição a opositores

PL 1595 cria polícia política com controle direto do presidente da república. Foto: Marcos Corrêa/PR PL 1595 cria polícia política com controle direto do presidente da república. Foto: Marcos Corrêa/PR

Atualizado em 8 de dezembro de 2021: o requerimento de urgência foi rejeitado em votação na Câmara dos Deputados 

A Câmara dos Deputados deve votar hoje (01) um requerimento de urgência para a apreciação do PL (Projeto de Lei) 1595/2019, que dispõe sobre “ações contraterroristas”. De autoria do deputado Major Vitor Hugo (PSL/GO), o texto prevê, entre outras coisas, a criação de uma “polícia política” composta por órgãos de Estado e controlada diretamente pelo presidente da República. Caso o requerimento seja aprovado, a entrada do projeto na pauta de votação do plenário da Câmara pode ser acelerada. 

Aprovado em uma comissão especial da Câmara em setembro deste ano, o PL 1595/2019 utiliza justificativas vagas “contraterroristas” para criar mecanismos que podem criminalizar movimentos sociais e outras organizações, ampliar a vigilância inconstitucional e isentar agentes públicos que cometerem crimes. O projeto é uma reedição de uma proposta apresentada em 2016 pelo presidente Jair Bolsonaro, então deputado federal.

Nesta quarta-feira (01), mais de 100 organizações da sociedade civil, que já haviam se manifestado contra o texto em outra ocasião, lançam a campanha “Lutar não é Crime” para tentar barrar a tramitação do projeto no Congresso Nacional.  

“Polícia política” de Bolsonaro

Na avaliação das entidades, o ponto mais crítico do texto está na criação do Sistema Nacional Contraterrorista e da Política Nacional Contraterrorista, que deverão ser instituídos pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Estes mecanismos terão como finalidade coordenar o preparo e emprego das forças militares, policiais e das unidades de inteligência nas ações contraterroristas e fornecerão informações para possíveis decretos de intervenção federal, estado de defesa ou de sítio em caso de “ações repressivas em território nacional”. 

Na prática, o projeto cria uma “polícia política” composta pelas Forças Armadas, Polícia Federal e Abin (Agência Brasileira de Inteligência), com controle direto do presidente da República, que passará a ter acesso amplo a dados privados e informações privilegiadas de todos os cidadãos, especialmente de opositores ao seu governo.

A criação deste mecanismo é ainda mais preocupante no momento em que a estigmatização, a perseguição e a criminalização de vozes dissidentes e dos movimentos sociais no Brasil têm sido estimulada por lideranças políticas ligadas ao governo federal. Soma-se a este cenário o uso arbitrário e abusivo das legislações penais já existentes pelo presidente Jair Bolsonaro para intimidar opositores, lideranças sociais, jornalistas e advogados. Entre os casos mais conhecidos estão o da liderança indígena Sônia Guajajara e do comunicador Felipe Neto, que foram processados pela extinta Lei de Segurança Nacional por criticarem o presidente da República. 

Portanto, o Congresso brasileiro, alinhado a este movimento de cunho autoritário, vem empreendendo esforços para ampliar uma legislação antiterrorista, que pode intensificar essas perseguições a opositores do governo Bolsonaro, especialmente no contexto das eleições de 2022.

Conceito amplo de terrorismo

Além da criação de uma “polícia política”, o texto estabelece um conceito de terrorismo a partir de critérios amplos e pouco definidos. Em nota técnica sobre o projeto de lei, Conectas, Rede Justiça Criminal e Instituto Brasileiro de Ciências Criminais afirmam que “nesta proposta, não há qualquer elemento que diferencie o ‘ato terrorista’ de crimes comuns”, pois os únicos requisitos para a sua configuração é que “sejam ofensivas à vida humana ou efetivamente destrutivas em relação a alguma infraestrutura crítica, “serviço público essencial ou recurso chave” que sequer precisam se concretizar, uma vez que basta que o agente ‘aparente ter a intenção’ de causá-los”. 

O projeto autoriza ainda a investigação e punição dos chamados “atos preparatórios”, ou seja, cria formas de intervenção policial sem ter a concretude do ato e, sendo assim, meras intenções poderão se tornar crimes. Outro ponto problemático está na parte do texto que diz que caso o agente público, em legítima defesa, provoque a morte ou ferimento de pessoas em uma ação contraterrorista, ele poderá ser isento de responsabilização. 

Relatores Especiais das Nações Unidas já solicitaram que o Brasil não proceda com o trâmite do texto durante a pandemia de covid-19, devido aos altos riscos que acarreta em direitos fundamentais, em especial a liberdade de expressão e associação. Em setembro, a  Alta Comissária das Nações Unidas para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, demonstrou preocupação com o projeto de lei e alertou para os eventuais abusos que podem ocorrer contra ativistas sociais e defensores de direitos humanos caso a proposta seja aprovada pelo Congresso. 

Informe-se

Receba por e-mail as atualizações da Conectas