Ensaios

Adoção internacional como medida de último recurso na África

Benyam D. Mezmur

Promover os direitos de uma criança ao invés do direito a uma criança

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RESUMO

A crescente popularidade das adoções internacionais não é algo recente. Recente, entretanto, é a atração que, cada vez mais, crianças africanas têm despertado em potenciais pais adotivos que vivem em outras partes do mundo, como exemplificado pelas adoções de Angelina Jolie e Madonna. As opiniões sobre a adoção internacional estão divididas entre a necessidade e conveniência desta prática, mas a visão que a considera uma panacéia para crianças sem pais e pais sem filhos prevalece. Por outro lado, alguns países têm se mostrado resistentes à retirada de crianças do Terceiro Mundo de seus ambientes familiares para serem alocadas em casas fora de seu país natal – prática entendida como “imperialista”. Atualmente, a idéia a qual a adoção internacional está ligada é a de que esta seria uma medida de último recurso, mas pesquisas sobre qual o seu verdadeiro significado (ou qual deveria sê-lo), e quais as suas implicações para a política de bem-estar da criança e para a legislação africana são difíceis de encontrar. Este artigo pretende contribuir para o preenchimento desta lacuna.

Palavras-Chave

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1. Introdução

A crescente popularidade da adoção internacional, desde sua introdução no cenário legal internacional após a II Guerra Mundial, não é recente. Recente, entretanto, é  crescente o interesse que crianças africanas têm despertado em potenciais pais adotivos que vivem em outras partes do mundo. Dentre outros fatores, não há dúvidas que esse recente interesse tenha sido incentivado pelo aumento da cobertura midiática que continua a sensacionalizar as condições de abandono e dos orfanatos de crianças africanas, notícias apresentadas ao público de todo o mundo, seguidas de informações sobre as últimas adoções internacionais com visibilidade na região. Logo, as adoções internacionais de Angelina Jolie (da Etiópia) e Madonna (de Malauí) vêm à mente.

As opiniões sobre a necessidade e moralidade da adoção internacional são divergentes. Entretanto, a visão que considera a prática uma panacéia para crianças sem pais e pais sem filhos prevalece. A adoção internacional como oportunidade de resgatar crianças de vidas destituídas é a percepção de muitos. Entretanto, a necessidade de alocar crianças do Terceiro Mundo privadas de seu ambiente familiar em casas fora de seus países nativos encontrou alguma resistência de seus Estados de origem, que consideram tal procedimento uma prática “imperialista.” Alguns países africanos decidiram restringir a adoção internacional para certas situações severamente definidas1 e, nos mais extremos, prevaleceu a preferência pela proibição da adoção internacional como um todo2.

Enquanto está em curso o debate a favor e contra a prática, o entendimento legal que tem surgido é de que a adoção internacional deve ser usada como medida de último recurso. O Comitê dos Direitos da Criança (Comitê CRC, sigla em inglês) reafirmou essa posição ao concluir que “a adoção internacional deve ser considerada à luz do Artigo 21, especificamente como medida de último recurso.” (COMITÊ CRC, 2004, §47). Organizações influentes como o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) coincidem com essa posição. De acordo com um dos princípios fundamentais que sustentam a prática da adoção internacional – o princípio de subsidiariedade – a adoção internacional é prevista apenas quando estabelecido que não há disponível nenhuma família substituta ou outro ambiente de cuidado no país de origem da criança.

Embora tenha se tornado um lugar comum dizer que a adoção internacional deve ser entendida como medida de último recurso, o que realmente isto significa (ou deveria significar) e quais são suas implicações nas políticas e leis de bem estar da criança na África são assuntos raramente pesquisados, sobre os quais existem poucas informações. Esse artigo é uma modesta tentativa de contribuir para o preenchimento dessa lacuna. Com esse propósito, vários tópicos apresentam-se para serem comentados: a adoção internacional deveria ser categoricamente uma medida de último recurso? O que afinal significa último recurso? Levando em conta o contexto sócio-econômico e cultural, cabe questionar como o “último recurso” deve ser compreendido e implementado no continente africano? Os membros da família biológica (pais e/ou família estendida) podem invocar o requisito de último recurso para repudiar a adoção internacional mesmo quando estiver claro que não é do melhor interesse da criança permanecer com a família biológica? Possíveis pais dos países de origem da criança podem invocar o requisito do “último recurso” para conseguir preferência categórica sobre, e acima qualquer perspectiva, de pais adotivos estrangeiros? Países africanos podem resistir a qualquer adoção internacional sob a alegação da força da identidade cultural do país de origem da criança? Sem nenhuma ordem específica, esse artigo tenta abordar esses tópicos. Acompanhado por recomendações preliminares, uma sessão conclusiva resume o trabalho.

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2. Estrutura jurídica internacional

Sob o direito internacional, nem a Declaração dos Direitos da Criança de 1924 nem a de 1959, determinaram condições claras para o princípio de subsidiariedade no contexto de cuidado alternativo para crianças privadas de seu ambiente familiar3. Entretanto, os três instrumentos que fazem da adoção internacional tema de legislação internacional de direitos humanos têm cláusulas ligadas ao princípio de subsidiariedade, incluindo a adoção internacional. Esses instrumentos são a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), a Carta Africana dos Direitos e Bem Estar da Criança (ACRWC, sigla em inglês), e a Convenção de Haia Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional (Convenção de Haia).

Como identificado pelo Comitê CRC, os chamados “quarto pilares” da CDC conferem às crianças o direito à não discriminação; direito a ter seus melhores interesses como “consideração primária” em todas as ações relacionadas a elas; o direito inerente à vida; e o direito daquela criança “que é capaz de formar seu próprio ponto de vista […] a expressar sua opinião livremente sobre todos os aspectos que afetem a criança.” (CDC, Art. 12). De acordo com o Artigo 21, a CDC procura assegurar, entre outras coisas, o uso padrão do princípio de “melhor interesse da criança”. Na verdade, é válido notar que a adoção é a única esfera amparada pela CDC na qual o melhor interesse da criança deve ser a principal consideração4. A CDC considera apropriada a adoção internacional apenas quando “a criança não pode ser colocada em uma família adotiva ou não pode, de maneira alguma, ser amparada em seu país de origem.” (CDC, Art. 21(b)). Também existem outras garantias que a CDC não endereça diretamente à adoção, mas que ainda assim possuem importantes implicações para a adoção internacional5. A CDC foi ratificada por 193 Estados6.

No contexto Africano, a CDC é complementada pela ACRWC7. O Artigo 24 da ACRWC lida com o tema da adoção internacional. A comparação entre o Artigo 24 da ACRWC e o Artigo 21 da CDC destaca fortes semelhanças e poucas diferenças entre eles. É suficiente para o propósito desse artigo mencionar que a ACRWC indica explicitamente que a adoção internacional é uma medida de “último recurso”. A ACRWC recebeu a ratificação de 45 países.

A Convenção de Haia é o tratado mais diretamente aplicável na esfera da adoção internacional. Ela afirma em seu preâmbulo que seus signatários “reconhecem que a criança, para o desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, deve crescer em um ambiente familiar, em uma atmosfera de alegria, amor e compreensão”. O preâmbulo também afirma que, para a criança que não pôde permanecer com sua família de origem, a “adoção internacional pode oferecer as vantagens de uma família permanente para aquelas crianças que não se pôde encontrar uma família adequada em seu Estado de origem.” De relevância mais direta para a hierarquia da adoção internacional, dentro das opções de cuidado para as criança privadas de seu ambiente familiar, temos o Artigo 4(b), que afirma que:

Uma adoção no escopo da Convenção pode acontecer apenas se as autoridades competentes do Estado de origem; b)determinarem que, depois que outras possibilidades de alocar a criança em seu Estado de origem foram levadas em consideração, uma adoção internacional seja do melhor interesse da criança. (CONVENÇÃO DE HAIA).

Mesmo que a CDC e a ACRWC tratem sobre a adoção internacional, esses instrumentos parecem ter uma visão bastante limitada e não muito clara de quando essa adoção é apropriada. Entretanto, é importante mencionar a compatibilidade da CDC e da ACRWC com a Convenção de Haia, que dá preferência a adoção no país de origem frente a adoção internacional. Contudo, a preferência justificada pela CDC e pela ACRWC para lares adotivos temporários no país de origem [no original, in-country foster care] e para a institucionalização frente a adoção internacional é mais controversa, e parece estar em contradição com a Convenção de Haia.

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3. Análise da adoção internacional como medida de último recurso

Visto que, sob o direito internacional, crianças privadas da convivência de suas famílias devem se beneficiar de cuidado alternativo, como (para citar relevantes dispositivos da CDC) “lares adotivos temporários, kafalah da legislação Islâmica, adoção ou, se necessário, o encaminhamento para uma instituição adequada” (CDC, art. 20(3)), a hierarquia a ser seguida e o lugar onde a adoção internacional deve figurar dentre essas opções continuam pouco claros. Por exemplo, é a adoção internacional ou o encaminhamento da criança aos cuidados de uma instituição que deverá ser considerada como medida de “último recurso”? O que pode e deve realmente significar “último recurso” para o melhor interesse da criança? A adoção doméstica deve sempre ter preferência sobre as outras opções de cuidado?

Tento em vista a diferente hierarquia entre as opções de cuidados alternativos conferidos à adoção internacional na implementação do princípio da subsidiariedade sob a CDC e a ACRWC de um lado, e a Convenção de Haia do outro, uma posição legal e finalmente capaz de promover os melhores interesses da criança africana através da adoção internacional deve ser encontrada.

3.1. Desdobramentos da adoção internacional como medida de último recurso: algumas observações preliminares

À princípio, é importante destacar que a adoção internacional como um cuidado alternativo foi ponto controverso durante a elaboração da CDC. Citando o travaux preparatoires, Detrick ressaltou que o representante do Brasil havia indicado que a delegação de seu país entendeu o Artigo 21(b) como a promoção de um meio alternativo de cuidado “quando todas as outras possibilidades foram exauridas.” (DETRICK, 1999; COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DAS NAÇÕES UNIDAS [CDH] 1989, §369). Como resultado, e acoplado ao não reconhecimento da prática sob a lei Islâmica, foi realizado um esforço para que a CDC caracterizasse a adoção internacional como exceção, e não como uma regra.

A idéia de fazer com que a adoção internacional estivesse geralmente subsidiária a outras opções de cuidado alternativo possui razões específicas, que estão inerentemente vinculadas à promoção dos melhores interesses da criança. A seguir apresento um breve olhar para algumas dessas razões e suas implicações.

3.2. Ênfase na família biológica e na adoção doméstica

Uma das primeiras implicações de se tornar a adoção internacional geralmente subsidiária com base na CDC, ACRWC, e Convenção de Haia, é pelo fato destes instrumentos darem primazia à convivência familiar (COEK, 2006)8. E dada esta preferência geral pelo ambiente familiar, supõe-se que as crianças crescerão melhor com sua família biológica ou com outras pessoas com quem já tenha convivido no ambiente familiar, se possível, e quando de acordo com o melhor interesse da criança9. Em concordância com essas afirmações, Hodgkin e Newell afirmam que a CDC estabelece uma “presunção […] de que os melhores interesses da criança estarão garantidos quando ela estiver com seus pais, sempre que possível.” (HODGKIN; NEWELL, 2002, p. 295). As implicações disso são que, de acordo com o Comitê CRC, apenas quando todas as opções para manter a criança com sua família se exaurirem e se provarem ineficientes ou impossíveis, que a adoção (ou qualquer outro tipo de cuidado alternativo) deve ser prevista (SYLVAIN; BOECHAT, 2008, p 25).

O provérbio que diz que “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança” é mais verdadeiro na África do que em qualquer outro lugar do mundo. Portanto, para o contexto africano, reconhecer o papel da família estendida e da comunidade é ainda mais pertinente. Como resultado, ao considerar a adoção internacional como geralmente subsidiária, os esforços que reconhecem o papel da família estendida e da comunidade para cuidar de suas crianças devem ser encorajados e apoiados.

Outra vantagem sobre o requisito de último recurso, de acordo com o princípio da subsidiariedade, é encorajar a adoção doméstica ao invés da adoção internacional (INTERNATIONAL REFERENCE CENTRE FOR THE RIGHTS OF CHILDREN DEPRIVED OF THEIR FAMILY – ISS/IRC, 2006b, p. 1). A adoção doméstica normalmente está no alto da hierarquia das opções disponíveis como cuidado alternativo para crianças privadas de seu ambiente familiar. O fato da adoção doméstica ser uma solução nacional, uma colocação permanente da criança e, ainda, oferecer um ambiente familiar, a coloca na frente de outras opções de cuidado alternativo. Além disso, existem evidências de que em países onde a adoção é bem estabelecida, há um alto nível na taxa de sucesso nas colocações permanentes, especialmente quando as decisões foram guiadas pelo melhor interesse da criança e as crianças foram adotadas, preferencialmente, ainda pequenas (TRISELIOTIS; SHIREMAN; HUNDLEBY, 1997).

3.3 Promovendo o uso de outras soluções domésticas

Tornar a adoção internacional subsidiária e como medida de último recurso possibilitaria o desenvolvimento e uso de outras opções domésticas de cuidados alternativos. Lares adotivos temporários, Kafalah da lei Islâmica/ lei Sharia, assim como a institucionalização da criança, enquanto de natureza doméstica, estão previstas sob o direito internacional e podem, algumas vezes, beneficiar crianças privadas dos cuidados de suas famílias.

Lares adotivos temporários, que deveriam ser realmente temporários, podem, no entanto, continuar até a vida adulta, mas não devem impedir a criança de retornar aos seus pais biológicos. Também não podem impedir a adoção (VAN BUEREN, 1998, p. 103). Entre as vantagens dos lares adotivos temporários está o fato de que ele oferece um ambiente familiar, possibilita este ambiente para a criança temporariamente privada dos cuidados de sua família e parece contribuir financeiramente para o sistema encarregado do bem estar da criança10. Na África, como na maior parte do mundo menos desenvolvido, o lar adotivo temporário tende a ser informal (frequentemente chamado de kinship care – cuidado por parentes)11. É menos desenvolvido e altamente desregulamentado por lei e por políticas públicas quando comparado às outras opções de cuidados alternativos.

Relacionadamente, a prática de Kafalah sob as leis Islâmicas (lei Sharia) implica na aceitação de crianças sem família no que é equivalente a uma forma permanente de lar adotivo temporário, mas sem que a criança em questão receba o nome da família ou os direitos à herança da família na qual foi colocada (HODGKIN; NEWELL, 2002, p. 295-296). Uma boa parte da população de diversos países africanos aderiu às leis Sharia. Um bom exemplo é a Nigéria. Países no continente (com exceção daqueles no Norte da África) que aplicam as leis Sharia em graus variados também incluem o Senegal, Somália, Mali, Chade, Sudão, Djibuti, Eritréia, Etiópia, Tanzânia, Quênia e Uganda. Portanto, o desenvolvimento do Kafalah como uma solução doméstica e familiar abarca a capacidade de promover os direitos da criança no continente.

Finalmente, enquanto uma discussão detalhada relacionada à institucionalização é adiada para uma sessão separada, vale mencionar que a institucionalização poderia desempenhar um papel curto e temporário na promoção dos direitos da criança privada do ambiente de sua família. Por exemplo, instituições podem servir como locais transitórios para crianças que aguardam adoção.

3.4 Manter a identidade cultural do país de origem

Considerar a adoção internacional subsidiária a qualquer outro cuidado alternativo possibilita a promoção da identidade cultural da criança. A identidade cultural é um tema transversal que tende a enfatizar a preferência pela família biológica (tanto pais quanto membros da família estendida) e pela adoção doméstica frente à adoção internacional. As opções anteriores geralmente garantem a continuidade da identidade cultural da criança quando ela cresce na cultura, língua e história de seu país de origem.

Entretanto, alguns proponentes da adoção internacional preferem uma interpretação mais ampla à noção de adoção internacional como último recurso. Em alguns momentos, encobertos pela desculpa de promover o melhor interesse da criança, esse grupo pode ter facilitado os interesses de possíveis pais adotivos internacionais e preferido dar pouca ou nenhuma importância à identidade cultural (SIMON; ALTSTEIN, 2000, p. 45-47). É importante lembrar que essa definição mais ampla pode não ser utilizada para fazer da adoção internacional um “primeiro recurso” e age como um facilitador para tornar a criança disponível para adoção internacional antes de considerar soluções domésticas, como a adoção.

Tal abordagem não estaria de acordo com as provisões da CDC e da ACRWC. Como Woodhouse (1995, p. 114) nota, “[…] a cultura de origem, não importa o quão difícil sua definição com lógica satisfatória, interessa à criança e, portanto, deve importar para a legislação de adoção”. Mesmo porque, no Artigo 20(3) da CDC lê-se que, quando consideramos soluções de cuidados alternativos, “devidas considerações devem ser levadas em conta no que tange a vontade de continuidade da educação da criança e de seu histórico étnico, religioso, cultural e lingüístico”.

Curiosamente, algumas vezes o mesmo conceito de identidade cultural é usado pelos oponentes da adoção internacional para negar um ambiente familiar à criança, mesmo quando está claro que a adoção internacional seria o melhor para os interesses da criança12. A idéia de que a adoção internacional permite que culturas dominantes e desenvolvidas “arranque o recurso mais precioso do país em desenvolvimento, suas crianças”, (KLEEM, 2000, p. 325-326) prevalece nesse grupo. Porque o direito da criança a um nome e nacionalidade são cruciais para sua identidade (CRC, Art. 7 e 8), “oponentes da adoção internacional argumentam que, ao invés de promover a identidade da criança, a prática a separa e a substitui por um nome e identidade escolhidos pelos pais adotivos” (OLSEN, 2004, p. 510). Infelizmente, é fato que alguns grupos (algumas vezes a nação como um todo) considera que reclamar o direito de custodia ou controle sobre suas crianças é um assunto (WOODHOUSE, 1995, p. 112) que tem prevalência em detrimento à proteção dos melhores interesses dessas crianças.

Entretanto, uma das realizações da CDC (e também da ACRWC) é elevar as crianças ao patamar de portadoras de direitos. Justificam afirmando que Estados possuem o direito a custodia e controle sob suas crianças, sem nenhuma consideração com os melhores interesses delas, reduzindo-as à “criança objeto”. Como corretamente advoga Woodhouse, “uma perspectiva focada na criança sugeriria que o direito à preservação da identidade de origem de um grupo é melhor analisada como direito da criança, e de responsabilidade e tutoria do grupo.” (WOODHOUSE, 1995, p. 112) Em alguns casos os conceitos de “continuidade” e “história” do Artigo 20(3) da CDC e do Artigo 25(3) da ACRWC são utilizados para justificar a primazia da identidade cultural, e servem como base para a proibição ou menosprezo da adoção internacional como um meio alternativo de cuidado. Entretanto, como Cantwell e Holzscheiter corretamente nos lembram:

[…] enquanto relacionadas, as questões da “continuidade” e da “história” não devem ser vistas como únicas e nem como o mesmo assunto. O texto do artigo 20 não demanda explicitamente “continuidade […] do histórico da criança […]”, mas requer que devida atenção seja dada tanto à continuidade da educação quanto ao histórico da criança. (CANTWELL; HOLZSCHEITER, 2008, p. 61).

Este argumento adiciona clareza à posição de que a cultura não pode, e não deve, ser usada como cortina de fumaça para negar o direito de uma crianças de crescer em um ambiente familiar, quando uma família só puder ser encontrada fora de seus país de origem. Além disso, “está claro no texto do Artigo 20 que não existe nenhuma responsabilidade absoluta para assegurar acontinuidade ou que a decisão sobre a qual o cuidado alternativo que será escolhido esteja baseado no histórico da criança, mas apenas que seja dada a ‘devida consideração’ para cada um desses fatores” (CANTWELL; HOLZSCHEITER, 2008, p. 63). Entretanto, em contraposição, não resolve nada legislar que “Estados-membros devam assegurar cuidados alternativos de acordo com suas leis nacionais” (CANTWELL; HOLZSCHEITER, 2008, p. 63).

À nível regional, interessantemente, a ACRWC expressa que devem ser consideradas “as virtudes de suas [dos Estados-membros africanos] heranças culturais, contexto histórico e dos valores da civilização africana, que deveriam inspirar e caracterizar suas reflexões sobre o conceito dos direitos e do bem estar da criança.” (ACRWC, 7ª cláusula do preâmbulo). Entretanto, mesmo que o Artigo 20(3) copie da CDC quase que palavra por palavra, a ACWC omite a palavra “cultural” quando lista as informações do passado da criança que deverão ser levadas em conta quando considerado o cuidado familiar alternativo (ACRWC, Art. 25(3)). Nesse sentido, se o melhor interesse da criança tem algum significado real, ou possa ser uma “consideração primordial” (CDC, Art. 21; ACRWC, Art. 4), a preservação da identidade cultural deve ser entendida como meio e não necessariamente como um fim em si próprio, quando considerado o cuidado alternativo de crianças privadas de seu ambiente familiar.

3.5 Protegendo crianças separadas de seus pais e refugiadas

O requisito de último recurso para a adoção internacional também tem implicações na promoção e proteção dos direitos de crianças separadas de seus pais e refugiadas. Nesse sentido, o Comentário Geral nº 6 do Comitê CRC sobre crianças separadas de seus pais e  refugiadas é de grande orientação. O Comitê primeiramente afirma que:

Estados devem respeitar completamente as condições previstas no Artigo 21 da Convenção assim como as de outros instrumentos internacionais relevantes, incluindo, particularmente, a Convenção de Haia para Proteção de Crianças e Cooperação em Respeito da Adoção Internacional, de 1993, e suas Recomendações Relacionadas à Aplicação a Refugiados e outras Crianças Internacionalmente Deslocadas, de 1994, quando considerarem a adoção de crianças […] desacompanhadas. (COMITÊ CRC, 2005, § 90).

Em seguida, destaca que os Estados devem, em particular, observar que a adoção de crianças desacompanhadas ou separadas só pode ser considerada quando for estabelecido que a criança está em condições para ser adotada. Na prática isso significa, inter alia, que os esforços com o objetivo de encontrar e reunir sua família falharam, ou que os pais consentiram com a adoção (COMITÊ CRC, 2005 § 91).

Claramente, crianças refugiadas desacompanhadas ou separadas de seus pais não podem ser adotados com pressa, no auge de uma emergência. Na verdade, a adoção não deve ser considerada onde ainda exista esperança de encontrar ou reunir a família, e a não ser que um tempo razoável tenha passado, durante o qual todas as maneiras viáveis para encontrar os pais ou outro membro familiar sobrevivente tenham sido utilizadas13. Além disso, adoção em um país de asilo não deve acontecer quando existe a possibilidade de, em um futuro próximo, repatriação voluntária sob as condições de segurança e dignidade do país de origem.

Tanto com base na CDC quanto na ACRWC14, crianças refugiadas desacompanhadas ou separadas devem ter acesso aos serviços básicos, a um procedimento de asilo e a cuidado temporário e proteção. Portanto, as autoridades relevantes devem identificar e determinar o melhor interesse da criança a longo prazo e seus cuidados. E, mesmo que a adoção internacional seja identificada como uma opção que atenda aos interesses da criança a longo prazo, não se deve recorrer a tal opção a não ser que todos os esforços para encontrar e reunir a família falhem, que sejam analisadas as opções de adoções dentro do próprio país e que um período razoável de tempo tenha passado. Portanto, a adoção internacional como medida de último recurso deve ser entendida como adoção severamente restrita para crianças refugiadas e separadas.

3.6 Movendo a adoção internacional de ultimo recurso para “nenhum recurso” em função do melhor interesse da criança

O simples fato de ser um Estado-membro da CDC e da ACRWC não torna automaticamente impositiva a nenhum país uma obrigação internacional que permita a adoção internacional como medida de cuidado alternativo. Uma leitura atenta da redação cuidadosa do Artigo 21 da CDC (assim como do Artigo 24 da ACRWC) revela que a advertência contida neste artigo determina que “Estados-membros que reconheçam e/ou permitam o sistema de adoção […]” (minha ênfase), enquanto o Artigo 24 da ACRWC fala dos “Estados Partes que reconheçam o sistema da adoção […]” (minha ênfase).

As travaux preparatoires da CDC indicam que essa condição foi adicionada durante as negociações em resposta às intervenções de vários países muçulmanos (particularmente Bangladesh), já que as leis islâmicas não reconhecem o conceito de adoção (CENTRO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA DIREITOS HUMANOS, 1995, p. 16). Portanto, adoção internacional como último recurso é indicativa de sua natureza subsidiária e, por extensão, que a prática não é necessariamente uma prioridade, ou por esse mesmo motivo não significa que seja necessariamente aceita como um meio alternativo de cuidado. Em outras palavras, a não existência da adoção internacional, ou a suspensão da mesma, em um Estado membro da CDC e/ou da ACRWC como um meio alternativo de cuidado não poderia ser uma violação desses instrumentos.

Baseado nesse fato, pode-se discutir que a possibilidade de mover a adoção internacional como uma medida de último recurso para uma medida de “nenhum recurso” é possível, e algumas vezes necessário. Porém, tal possibilidade (e algumas vezes necessidade) deve ser explorada apenas para promover e proteger os melhores interesses da criança, e não prejudicá-los. Em outras palavras, o fato de não existir obrigação que permita a adoção internacional como meio de cuidado alternativo também implica, mesmo que remotamente, na possibilidade de suspender a prática quando o melhor interesse da criança estiver comprometido. Portanto, existe a necessidade e possibilidade de impor uma suspensão das adoções internacionais em momentos nos quais um país é afetado por uma catástrofe ou quando irregularidades estão comprometendo os melhores interesses da criança. Como exemplo, a República do Congo, que ainda enfrenta em algumas partes de seu território violência e conflitos armados, anunciou que estava suspendendo todas as adoções internacionais por causa dos eventos ocorridos no Chade (SERVIÇO SOCIAL INTERNACIONAL – ISS, 2008a, p. 3). O Ministério do Bem Estar Social do Governo de Zâmbia, o Governo de Togo e, apenas recentemente, o Governo da Libéria também suspenderam as adoções internacionais (ISS, 2008b, p. 3). As razões oficiais fornecidas para a suspensão da adoção internacional nesses três países foram: a necessidade de garantia que a prática atenda o melhor interesse da criança, e para desvendar as disfunções do sistema de adoção que têm potencial para violar os direitos da criança (ISS, 2008b, p. 3).

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4. Quão último é o “último recurso”?

Central a esse artigo é a tentativa de, senão como resposta à, ao menos para explorar os possíveis significados e implicações do que é, e o que deveria ser, entendido por adoção internacional como medida de último recurso. Além das observações preliminares, tal exploração, dentre outras coisas, requer: pesar os valores das outras opções de cuidado, em particular, comparar a adoção internacional com institucionalização; olhar a posição do Comitê CRC referente a este assunto; e, finalmente, recorrer às regras da justiça juvenil para desenhar uma possível, mas remota, similaridade com a linguagem do “último recurso” no contexto de privação de liberdade, e investigar se alguma direção é viável para alcançar um melhor entendimento do conceito que quer tornar a adoção internacional como um “último recurso”.

4.1 A hierarquia das opções de cuidados alternativos

Inúmeros especialistas criticaram o fato da CDC ter falhado ao tentar esclarecer de maneira bem sucedida a devida hierarquia das soluções a serem providas às crianças privadas do ambiente de suas famílias (DILLON, 2008, p. 40). No Preâmbulo do projeto do Protocolo para a Convenção das Nações Unidas para o Direito das Crianças (UNCRC) em Orfanatos Sociais, Dillon destaca sua preocupação que “[…] os Artigos 20 e 21 da UNCRC não sejam suficientemente claros sobre o relacionamento entre a criança em desenvolvimento e a necessidade urgente pela permanência em uma situação familiar.” (DILLON, 2008, p. 85).

A UNICEF segue os seguintes princípios para hierarquizar as opções que geralmente regem e asseguram a longo prazo os melhores interesses no cuidado da criança, uma vez que a necessidade para tais cuidados tenha sido demonstrada:

– soluções baseadas na família são geralmente preferidas frente às alocações institucionais;
– soluções permanentes são geralmente preferidas frente às inerentemente temporárias; e
– soluções nacionais (domésticas) são geralmente preferidas às envolvendo outros países.
(FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA INFÂNCIA – UNICEF, 1998, p. 5).

Avaliada frente a essa lista, a adoção internacional preenche os requisitos dos dois primeiros princípios, mas não do terceiro, enquanto os lares adotivos temporários preenchem o primeiro e o terceiro, e muitas vezes não preenchem o segundo. O mesmo não pode ser dito sobre a institucionalização15, já que esta medida não é nem baseada na família, nem permanente (normalmente). Portanto, de acordo com estes princípios, a adoção internacional e o lar adotivo temporário são invariavelmente considerados subsidiários para qualquer outra solução prevista que corresponda aos três princípios – em particular, a adoção doméstica. Entretanto, eles devem ser cuidadosamente pesados contra qualquer outra solução que também encontre dois desses princípios básicos16, e não devem ser automaticamente considerados excluídos em favor da institucionalização. Essa abordagem se apóia no fato de que determinar o melhor interesse da criança não pode ser restringido por fórmula legal mecânica ou através de um quadro hierárquico rígido de opções de cuidado17.

É pertinente nesse momento expressar algumas palavras de cuidado. Primeiro, é importante entender que o uso do termo último recurso é relativo e depende de quais opções que estão disponíveis como cuidado alternativo. Pode-se discutir que todas as opções de cuidado alternativo deveriam ser consideradas como medidas de último recurso, se comparadas com a opção de manter a criança com sua família biológica. Nesse sentido, o Comitê da CRC acredita que “[…] em muitos Estados-membros o número de crianças separadas de seus pais e colocadas em situação de cuidado alternativo está aumentando e em grau elevado” (COMITÊ CRC, 2006, § 654). Como resultado desta constatação, o Comitê da CRC expressou preocupação com o fato de “[…] essas colocações não serem sempre medidas de último recurso e, portanto, não serem do melhor interesse da criança” (COMITÊ CRC, 2006, §654). A referência feita pelo Comitê da CRC a “seus pais” implica a pais biológicos ou adotivos. Ainda, a referência à “essas colocações” inclui todas as opções de cuidado alternativo (como lares adotivos, cuidado residencial e outras formas de cuidado alternativo), e destaca que essas opções devem ser medidas de último recurso após todas as tentativas de manter a criança com sua família biológica tenham falhado.

Mesmo quando a escolha é entre adoção internacional e outra opção de cuidado alternativo, podem existir circunstâncias excepcionais que requeiram que a adoção internacional seja medida de primeira instância. Para mencionar um exemplo, seria muito difícil sustentar que uma criança privada do ambiente familiar que tenha a chance de ser colocada em um novo lar com uma tia de fora de seu país deva ser institucionalizada simplesmente porque a adoção internacional deve ser uma medida de último recurso. Em outras palavras, o princípio de subsidiariedade deveria estar sujeito aos melhores interesses da criança18.

Na verdade, a natureza não primordial do princípio da subsidiariedade está bem articulada no julgamento da Corte Constitucional da África do Sul. O caso AD e Outro vs. DW e Outros19 discutiu a custodia única e guarda única de cidadãos dos Estados Unidos da América que queriam adotar uma criança sul africana, o Bebê R. Como interpretar e aplicar esses princípios no caso do Bebê R foi debatido tanto nas instâncias inferiores, quanto na Corte Constitucional. Em sua argumentação, mesmo que a Corte tenha concordado que o princípio da subsidiariedade “tenha que estar ligado a diversos fatores que regem os princípios da adoção internacional, uma investigação contextualizada caso à caso deve ser conduzida por agentes responsáveis pela proteção infantil e por oficiais judiciais peritos nos princípios envolvidos”, e alertou em sua declaração que “não é para ser dito que o princípio da subsidiariedade é o principal fator governante nas adoções internacionais20” – no entanto, é o princípio do melhor interesse da criança que foi acordado como sendo o principal fator governante21.

Um ponto que merece destaque no contexto da adoção internacional (ou por esse motivo, qualquer outra opção de cuidado alternativo) é o papel da participação da criança. Como mencionado acima22, o direito da criança “capaz de formular seu próprio ponto de vista […] e de expressa-los livremente em todos os assuntos que afetem a criança” (Artigo 12 do CDC e Artigo 7º do ACRWC) é um dos quatro princípios fundamentais de ambas as convenções, CDC e ACRWC. Dependendo do desenvolvimento gradual da criança, e da opinião da mesma, existe a necessidade de se reconhecer que a adoção internacional pode ser tanto uma medida de primeiro quanto de último recurso.

Finalmente, o argumento de que a redação da CDC e da ACRWC prevê soluções nacionais acima das soluções com base na família pode ser contraposto pela idéia de que esses instrumentos precisam ser interpretados progressivamente. Mesmo porque a CDC, assim como a ACRWC e todos os instrumentos de direitos humanos, devem ser considerados instrumentos vivos, cujas interpretações se desenvolvem com o tempo. Somos lembrados deste fato pelo Comitê da CRC (COMITÊ CRC, 2007a, § 20). Nesses termos, a suposição inicial da CDC e da ACRWC de que a adoção internacional, sendo um cuidado alternativo não nacional, deveria ser caracterizada como subsidiária à qualquer outra opção nacional de cuidado alternativo tal como a institucionalização, não deveria ser aceita como válida, especialmente com base na evidência contemporânea das sérias deficiências desta última opção (EVERYCHILD, 2005; ISS/IRC, 2006a, p. 9).

4.2 Adoção internacional versus institucionalização

No contexto de cuidado alternativo para crianças, a palavra “instituições” aparece na CDC (Art. 3(3)), na ACRWC (Art. 20(2)(b)), e na Convenção de Haia (Art. 4(c)(1)). Não obstante, a referência a “instituições” deixa sem resposta a questão de qual é o alcance desta palavra (CANTWELL; HOLZSCHEITER, 2008, p. 53). Considera-se que “’cuidado residencial’ ou ‘cuidado institucional’ refere-se a grupos vivendo sob cuidado fornecido por adultos pagos que em outros casos não seriam considerados tradicionalmente responsáveis pelo cuidado destas crianças naquela sociedade.” (UNICEF, 2006, p. 35). Se “instituições” é usado apenas para se referir a orfanatos23, a questão então levantada é: qual o papel das denominadas “opções de cuidado intermediário” como os “lares coletivos”24?

Já que “lares coletivos” por definição constituem pequenas construções residenciais localizadas em uma comunidade, projetados para servir as crianças, pode-se argumentar que esse tipo de moradia é mencionado tanto na CDC (art. 20(3)) quanto no ACRWC (Art. 25(2)) como “instituições adequadas”. Portanto, enquanto a tendência atual é a de colocar os orfanatos e os lares coletivos de diversos tamanhos sob o guarda-chuva do “cuidado institucional” (DILLON, 2008, p. 40), em oposição aos orfanatos, esses ambientes que lembram a família, como os lares coletivos, podem melhor resistir ao minucioso exame das normas de direitos humanos.

A qualificação das instituições como “adequado” encontra sua motivação nas experiências globais durante e antes a redação da CDC. Desde 1980 a comunidade internacional começou a progressivamente entender o efeito prejudicial da institucionalização de crianças (HUMAN RIGHTS WATCH – HRW, 1996). Assim, os efeitos deploráveis da institucionalização nos aspectos emocionais, psicológicos e do desenvolvimento da criança são bem documentados (ZEANAH, 2003, p. 886-88; MARSHALL; FOX; BEIP Core Group, 2004, p. 1327).

As políticas da Convenção de Haia sobre a institucionalização não estão explícitas no instrumento. Entretanto, é possível decifrar a posição do instrumento nesse assunto através de sua interpretação. Uma vez que a Convenção de Haia reconhece a adoção internacional como uma alternativa válida em situações nas quais a “família adequada” (3ª cláusula do preâmbulo) não pode ser encontrada no Estado de origem da criança, a institucionalização poderia ser discutida (não como um cuidado alternativo com base familiar) sob a perspectiva da Convenção de Haia como uma medida de último recurso, colocada logo após a adoção internacional. A posição exposta pela Secretaria da Conferência de Haia afirma que “como uma regra geral, não é desejável deixar a criança aguardando em uma instituição quando existe a possibilidade de colocá-la em uma família permanente no exterior” (PERMANENT BUREAU OF THE HAGUE CONFERENCE ON PRIVATE INTERNATIONAL LAW, 2008, p. 30) e é apoiada pelo texto da Convenção de Haia.

A questão de como a noção de último recurso deve ser interpretada quando a opção é entre institucionalização e adoção internacional tem sido sujeito de minucioso exame judicial. No recente caso da Madonna no Malaui25 sobre a adoção de uma criança que estava em um orfanato, a definição acordada de “último recurso” foi colocada em destaque pela Suprema Corte. O juiz, após citar todo o Artigo 24(b) da ACRWC e enfatizar a noção de último recurso de sua decisão, determinou que:

Claramente a adoção internacional deve ser a última alternativa. […] É evidente, entretanto, que CJ não está mais sujeito às condições de pobreza de seu lugar de nascimento como descrito pelo Oficial Probatório desde sua admissão no Orfanato Kondanani. Nessas circunstâncias, podemos dizer que CJ não pode, de maneira nenhuma, ser cuidada em seu próprio país de origem? As respostas para minhas perguntas são negativas. No meu ponto de vista “qualquer maneira adequada” refere-se ao estilo de vida nativo ou uma vida próxima à que a criança está levando desde o nascimento26.

Parcialmente baseado nessa argumentação, o juiz não deu provimento ao pedido de adoção da criança.

Em recurso, entretanto, a Suprema Corte de Malauí corretamente discordou da decisão da instância inferior. A Corte reconheceu que não houve nenhuma família em Malauí que manifestou interesse em adotar a criança CJ, também não houve nenhuma tentativa de colocar a criança CJ em uma família de lar adotivo temporário27. Isso, pela visão da Corte, deixava duas opções – a criança “pode tanto continuar no Orfanato Kondanani e não ter nenhuma vida familiar ou pode ser adotada pela Apelante e crescer com a família que a Apelante está lhe oferecendo”28. Em uma clara preferência à adoção internacional, em oposição à institucionalização, a Suprema Corte concluiu que “o bem estar da criança CJ será melhor cuidado se adotado por pais estrangeiros do que se crescer em um orfanato onde ela não terá vida familiar, não terá amor ou afeto dos pais”29 e declarou procedente a apelação, permitindo, portanto, a adoção.

Na África, é documentado que a infeliz falta de desenvolvimento de opções de cuidado alternativo baseados na família levou ao “desnecessário uso excessivo das colocações residenciais” (ISS; UNICEF, 2008, p. 7). Em apoio a essa afirmação, um trabalho conjunto da ISS e UNICEF (2008, p. 7) cita a experiência no Zimbábue. Adequadamente,

a ocupação média dos orfanatos do Zimbábue é de 106% ao todo, e 128% nas instituições governamentais. A experiência deles é de não conseguir construir orfanatos suficientes para a demanda do país – aqueles que são construídos sempre estão cheios por atraírem crianças, mesmo que geralmente pelas razões erradas. Pesquisas mostram que a maioria das crianças em instituições não precisariam estar lá […] – apenas 25% não tem nenhum parente conhecido […],e pelo menos 45% tem a mãe viva. A maioria das crianças pode ser reintegrada às suas famílias através de um bom serviço social. (MEETING ON AFRICAN CHILDREN WITHOUT FAMILY CARE apud ISS; UNICEF, 2004, p. 7).

Também existem evidências empíricas de que o movimento para tornar as instituições a primeira resposta, e a solução, para o cuidado alternativo é suscetível a ser contra-producente. Por exemplo, ele pode enfraquecer a motivação da comunidade na resolução dos problemas relativos aos órfãos e desviar recursos das soluções baseadas na família, que são a melhor opção para a criança (OLSON; KNIGHT; FOSTER, 2006, p. 3).

Na prática, existe uma tendência em interpretar erroneamente a posição dos instrumentos de direitos humanos para a institucionalização das crianças. Não é incomum testemunhar o planejamento e desenvolvimento sistemático de novas instituições como prioridade para a assistência às crianças privadas do ambiente de suas famílias30. Algumas vezes tais políticas são justificadas com base no Artigo 18(2) da CDC e no Artigo 20(2)(b) da ACRWC. Entretanto, a referência feita ao Artigo 18(2) da CDC (e ao Artigo 20(2)(b) da ACRWC) que garante que os Estados-membros “assegurem o desenvolvimento das instituições, estabelecimentos e serviços para o cuidado das crianças” não significa a facilitação de uma política sistemática para o estabelecimento de orfanatos como prioridade no cuidado das crianças. Ao invés disso, existe uma necessidade em tornar essas instituições secundárias e permitir que sejam subsidiárias à relação com os pais. Crianças não devem se tornar crianças do Estado sem necessidade.

Toda essa discussão tende a apontar em uma direção – existe uma crescente tendência em apoiar a instituicionalização generalizada (e não necessariamente a adoção internacional) como medida de último recurso. Enquanto a institucionalização deveria continuar a ter um papel temporário, como plataforma de transição para crianças privadas de ambiente familiar, seu uso como medida de longo prazo demanda sérias considerações.

4.3.  “Último recurso” através das lentes do Comitê CRC: esclarecimento ou confusão?

O Comitê CRC, enquanto órgão supervisor da implementação da CDC, tem manifestações de autoridade na interpretação das provisões da Convenção. Infelizmente, o Comitê da CRC tem enviado mensagens confusas (senão contraditórias) no que tange ao que deve ser considerado como medida de último recurso para o cuidado alternativo de crianças privadas de seu ambiente familiar.

Para ilustrar: já foi mencionado acima que o Comitê CRC rotulou em inúmeras ocasiões a adoção internacional como medida de ultimo recurso31. Em contraposição a essa posição, através das observações conclusivas dos relatórios sobre os Estados membros, e no Comentário Geral No. 3, intitulado “HIV/AIDS e os direitos da criança”, o mesmo Comitê declarou que:

[…] qualquer forma de cuidado institucionalizado para as crianças deveria servir apenas como medida de último recurso, e essas medidas devem estar de total conformidade com a proteção dos direitos da criança e salvaguarda-las de todas as formas de abuso e exploração (COMITÊ CRC, 2003, § 35).

No contexto de crianças com deficiências, o Comitê CRC reiterou uma posição similar32.

Portanto, a posição do Comitê CRC no que tange à questão se “a adoção internacional ou a institucionalização deverão ser consideradas medida de último recurso?” continua sem resposta33. Neste meio tempo, entretanto, o Comitê CRC esclarece que a institucionalização pode ser considerada como medida de último recurso. Também é indicativo a necessidade do Comitê CRC em articular com clareza sua posição sobre o assunto (talvez através de um Comentário Geral) e, assim, contribuir para a compreensão dos Estados membros sobre qual o lugar da adoção internacional como medida de cuidado alternativo.

4.4.  Compreendendo o “último recurso”: alguma lição pode ser extraída dos princípios de justiça da infância e juventude?

Como tentativa de estabelecer o significado de último recurso, uma orientação pode (remotamente) ser solicitada no Artigo 37(b) da CDC, que é a única provisão da Convenção que usa essa frase. Nos termos do Artigo 37 (b) da CDC:

Nenhuma criança deve ser privada de sua liberdade de maneira arbitrária ou ilegal. A prisão, detenção ou aprisionamento da criança deve estar em conformidade com a lei e deve ser usada apenas em medida de último recurso para o mais curto período de tempo apropriado.

Para começar, entretanto, é pertinente considerar alguns tópicos gerais sobre o contexto. Esmiuçar o significado e as implicações do critério do “último recurso” na esfera da justiça da infância e juventude não presume que o propósito das buscas por cuidado alternativo, por um lado, e a privação de liberdade como uma medida de último recurso no contexto de justiça da infância e juventude, por outro, sejam os mesmos. Com base nos chamados 3Ps (proteção, provisão e participação do CDC e da ACRWC), pode-se afirmar que o primeiro – cuidados alternativos – seja melhor definido como uma combinação de proteção e provisão, ao passo que o último – privação de liberdade – tem a proteção como mantra. Em segundo lugar, frequentemente são as crianças menores as mais afetadas pela adoção internacional, enquanto a justiça da infância e juventude é dirigida para crianças mais velhas. Em terceiro lugar, a privação de liberdade é uma medida jurídica criminal enquanto a adoção internacional não é. Tirando essas diferenças, tanto a busca por cuidados alternativos para crianças privadas de ambiente familiar quanto a privação da liberdade como medida de último recurso no contexto da justiça da infância e juventude, devem supostamente ser aplicadas de acordo com os melhores interesses da criança. Tal igualdade – a promoção e proteção dos interesses da criança – deve criar uma plataforma lógica e útil para a comparação.

O padrão para privação de liberdade como medida de último recurso requer que consideremos “a intenção de privação de liberdade realmente como a última opção (sem que haja outras alternativas que interfiram menos nos direitos da criança).” (SCHABAS; SAX, 2006, p. 84). No cuidado alternativo, portanto, isso poderia significar recorrer à adoção internacional quando este for considerado o último cuidado alternativo adequado, após constatarem que não existam outras alternativas que se adaptem melhor à situação da criança em questão. Apenas recentemente, em 2008, Lieffard argumentou que o princípio do último recurso não implicaria que todas as outras alternativas devam ser procuradas primeiro, antes que a privação de liberdade seja imposta34. Se “último recurso” for interpretado da mesma maneira com relação à adoção internacional, ou seja, se todas as opções de cuidado alternativo não forem necessariamente consideradas primeiro e, se aquelas autoridades que exercem algum nível de deliberação ao acessar as diferentes opções finalmente decidir qual dessas provavelmente terá o efeito desejado, então o uso do termo parece manter seu potencial de promover o melhor interesse das crianças que foram privadas de seu ambiente familiar.

Portanto, a interpretação no âmbito da justiça  da infância e juventude  de que o critério de último recurso não necessariamente determina que todas as alternativas possíveis sejam consideradas antes de se decidir pela privação de liberdade encaixa bem com os melhores interesses da criança. Nesse esquema de cuidado alternativo, também, tal interpretação tem um melhor potencial para a promoção dos direitos das crianças privadas de seu ambiente familiar. Se para poder cumprir com o requisito de último recurso deveria ser adotada uma abordagem que determinasse tentar todos os cuidados alternativos disponíveis de maneira inflexível, antes de considerar a adoção internacional uma opção válida, implicaria que, dentre outras coisas, crianças esperariam desnecessariamente por mais tempo que o normal antes que um ambiente familiar pudesse ser encontrado.

Além disso, se este argumento, de que sob a perspectiva da justiça da infância e juventude o critério do último recurso implica que a privação de liberdade não pode ser “imposta sem uma avaliação adequada que leve em consideração as circunstâncias específicas do caso e das necessidades individuais daquela criança” (LIEFFARD, 2008, p. 195), for considerado em outro contexto, as decisões pelas opções de cuidado alternativo poderão ter implicações positivas. Principalmente por estar implícita nesta conotação de cuidado alternativo que uma abordagem verdadeiramente centrada na criança exigirá um exame próximo e individualizado, que precise sua situação real de vida. Portanto, uma regra que prevê categoricamente a adoção internacional como medida de último recurso não deveria ser usada de maneira que comprometa os melhores interesses da criança.

05

5. Observações Finais

Existe uma vasta literatura que testemunha a tendência de interpretar a adoção internacionalcategoricamente como uma medida de último recurso. Também sustentam que, baseado no princípio de subsidiariedade, a adoção internacional é um último recurso. Na África, o fato do Artigo 24 da ACRWC requerer explicitamente que a adoção internacional seja uma medida de último recurso, poderá dar aos Estados africanos espaço para tratar a prática como tal.

Com base na discussão prévia, é possível chegar a algumas conclusões e recomendações. A idéia de fazer a adoção internacional geralmente subsidiária a qualquer outro tipo de cuidado alternativo tem seus próprios méritos, que são inerentemente focados na promoção dos melhores interesses da criança. No contexto africano, isso pode significar, por exemplo, dar à familiar estendida (e comunidades) um papel maior no cuidado da criança privada do ambiente de sua família antes de aceitar outra opção de cuidado alternativo. Ademais, na África, a pobreza financeira e material, ou condições direta e unicamente imputáveis a tal pobreza, nunca deveriam servir como justificativa para a remoção da criança do cuidado paternal, para receber a criança em cuidado alternativo, ou para coibir que ele ou ela reintegre a família35.Esses cenários devem ser vistos como um sinal para a necessidade de prover apoio adequado à família. Também deveriam ajudar a promover soluções domésticas, que poderiam contribuir para a manutenção da identidade cultural da criança.

Entretanto, enquanto nós africanos nos orgulhamos de nossa cultura, é importante que os direitos individuais das crianças africanas não sejam atrapalhados por discussões acerca do rumo da história, se a adoção internacional constitui “essencialmente um vestígio do colonialismo”, e discussões sobre orgulho nacional. Tendo nomeado crianças como portadoras de direitos, nenhuma idéia de orgulho nacional ou de crianças como “recursos” nacionais poderia ser usada para negar às crianças uma forma adequada de cuidado alternativo, mesmo se tal cuidado adequado pudesse apenas ser encontrado na adoção internacional. “Adoção internacional como uma medida de último recurso” deveria ser entendida como “adoção internacional geralmente subsidiária a outro meio alternativo de cuidado”, mas sujeito a exceções. Além disso, “último recurso” não deveria significar quando todas as outras possibilidades forem exauridas36.

Uma abordagem detalhada, na qual todas as opções de cuidado disponíveis seriam pesquisadas antes de se considerar a adoção internacional, contrariaria a suposição de que é importante destinar um lar à criança ainda muito nova. Deveria ser estimulada uma idéia de “último recurso” que não impeça a destinação legal apropriada da criança a um lar ainda no início de sua vida. Além disso, ao entender a adoção internacional como medida de último recurso, a participação da criança, dependendo da sua capacidade evolutiva, deveria ser permitida.

A falta de uma fórmula clara no que tange à hierarquia das opções de cuidados alternativos tem também seu próprio, entretanto não-intencional, lado positivo. Esse argumento é validado pelo fato de que determinar o melhor interesse da criança não pode estar circunscrito por fórmulas legais mecânicas ou através de uma rígida hierarquia de opções de cuidados. Como discutido acima37, uma abordagem centrada verdadeiramente na criança requer um exame próximo e individualizado da situação real de vida da criança envolvida. Aplicar uma fórmula inflexível e predeterminada com o único objetivo de prover uma diretriz clara, independentemente das circunstâncias, poderia ser contrária aos melhores interesses da criança em questão.

Países africanos deveriam unir-se à tendência internacional que entende a institucionalização, particularmente a de longo prazo, como uma medida de último recurso. É aconselhável que o Comitê CRC ou o Comitê Africano de Especialistas no Direito e Bem Estar da Criança sob a ACRWC dê uma direção mais clara nesse sentido.

Concluindo, deve-se ter precaução (incluindo certo grau de auto-restrição) para evitar o uso indevido da expressão “último recurso”, seja para promover os interesses dos prováveis pais adotivos nacionais e internacionais, organizações de bem-estar da criança, seja para promover os interesses nacionalistas de um estado. Em outras palavras, as necessidades políticas, sociais, culturais e econômicas do continente africano não entram em conflito com os melhores interesses da criança africana que tenha sido privada do ambiente familiar ou do devido cuidado alternativo. Portanto, onde a adoção internacional for identificada como o melhor interesse da criança, deveria ser considerada como um cuidado alternativo, independentemente do requisito de último recurso. Estados devem ser prudentes para não fornecer provas às criticas daqueles que olham a adoção internacional como uma operação que visa atender o interesse de uma família que procura por uma criança, ao invés de atender ao interesse prevalente da criança que esteja procurando por uma família.

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Notas

1. Alguns países como Botswana, Malauí, Serra Leoa e Zâmbia possuem um requisito de residência para possíveis pais adotivos.

2. Por exemplo, a Nigéria.

3. O que mais se aproxima do princípio de Subsidiariedade sob a Declaração de 1959 é o Princípio 6 que, em parte pertinente, afirma que a criança deve, sempre que possível, crescer sob os cuidados e responsabilidade de seus pais e, em todos os casos, em uma atmosfera de afeição e segurança moral e material.

4. Isso é em oposição a ser simplesmente consideração primária em todos os outros campos.

5. Essas incluem o Artigo 8 que preserva o direito da criança a sua identidade, nacionalidade, nome e relações familiares sem interferência ilegal. Ainda, o Artigo 18 que legisla sobre a responsabilidade parental enquanto o Artigo 20 se relaciona às crianças privadas de suas famílias.

6. Dois países, a Somália e os Estados Unidos, ainda não a retificaram.

7. Foi para dar à CDC aplicação específica dentro do contexto africano que a ACRWC foi adotada pela OUA (agora União Africana ou UA)

8. O Doek (2006) descreve esse princípio como o “princípio líder na implementação do CDC”.

9. “A remoção da criança do cuidado da família deve ser visto como medida de último recurso e pela menor duração possível. A decisão de remoção deve ser revista regularmente e o retorno da criança aos cuidados dos pais deve ser assegurado quando as causas originais de remoção tenham sido resolvidas ou tenham desaparecido.” (NAÇÕES UNIDAS, 2007, Art. 13)

10. Uma pesquisa sugere que o custo do cuidado em ambiente familiar residencial demonstrou ser três vezes o custo da adoção em lares temporários (BROWNE, 2005, p. 1-12).

11. Fornecendo algumas contribuições ao debate e à pratica de adoção em lares temporários, esse estudo destaca informações sobre a experiência da adoção em lares temporários em países em desenvolvimento, que tende a ser informal e não documentado.

12. Veja, por exemplo, a entrevista com a Baronesa Emma Nicholson, Relatora do Parlamento Europeu pela Romênia (CENTRUL ROMAN PENTRU JURNALISM DE INVESTIGATIE – CRJI, 2001).

13. Esse período de tempo pode variar por várias circunstâncias, em particular, aquelas relativas à habilidade de conduzir uma investigação adequada; entretanto, o processo de procura deve estar completo dentro de um tempo razoável.

14. Veja o Artigo 22 da CDC e o Artigo 23 da ACRWC para checar alguns dos direitos das crianças refugiadas.

15. Mesmo que parcialmente discutível, como, em circunstâncias excepcionais, a institucionalização pode ser considerada permanente para as crianças, conhecidas como “difíceis de adaptar” a outros lares.

16. Naturalmente, a solução encontrada, e o efeito que causará tal decisão, deve sempre respeitar totalmente os direitos e o melhor interesse da criança.

17. AFRICA DO SUL. M. Corte Constitucional v Sentença Estadual. 26 set. 2007a, § 24.

18.É debatido que a posição que o princípio da subsidiariedade assume é por si só subsidiário – subsidiário à defesa do melhor interessa da criança (NICHOLSON, 2000, p. 248).

19. ÁFRICA DO SUL. CORTE CONSTITUCIONAL. AD e Outro v DW e Outros. CT48/07

20. ÁFRICA DO SUL. CORTE CONSTITUCIONAL. AD e Outro v DW e Outros. CCT48/07. Sentença. 7 dez. 2007b, § 48.

21. ÁFRICA DO SUL. CORTE CONSTITUCIONAL. AD e Outro v DW e Outros. CCT48/07. Sentença. 7 dez. 2007b, § 49-50.

22. Veja a sessão dos “Mecanismos legais internacionais” acima.

23. Deve-se notar que normalmente são as instituições residenciais de cuidado para crianças pequenas que são conhecidas como “orfanatos”.

24. Por definição, grupo de casas são pequenas construções residenciais localizadas em uma comunidade e projetadas para servir as crianças.

25. MALAWÍ, ALTA CORTE. No caso de Ato de Adoção de Crianças CAP. 26:01 e no caso de Chifundo James (uma menina) do C/O Mr. Peter Baeti. Caso de Adoção no 1 de 2009. Sentença 2009a p.6

26. MALAWÍ, ALTA CORTE. No caso de Ato de Adoção de Crianças CAP. 26:01 e no caso de Chifundo James (uma menina) do C/O Mr. Peter Baeti. Caso de Adoção no 1 de 2009. Sentença 2009a p.6

27. MALAWÍ, ALTA CORTE. No caso de Ato de Adoção de Crianças CAP. 26:01 e no caso de Chifundo James (uma menina) do C/O Mr. Peter Baeti. Caso de Adoção no 1 de 2009. MSCA Apelação da Adoção no 28 de 2009. 2009b, p. 18.

28. Ibid.

29. Ibid

30. E ainda, pesquisa conduzida em 2006 encontrou que, na África, existe uma preocupação crescente sobre a quantidade de novos orfanatos que estão sendo construídos em resposta às necessidades identificadas de crianças afetada com HIV e AIDS (NAÇÕES UNIDAS, 2006)

31. Veja a sessão de introdução acima.

32. Sob o Comentário Geral n. 9, § 47, é estabelecido que o Comitê CRC “urge a todos os Estados Membros a alocar em instituições apenas como medida de último recurso, quando for absolutamente necessário e no melhor interesse da criança.” (COMITÊ CRC, 2007b).

33. “Geralmente” porque são os casos convencionais (não excepcionais) que estão sendo levados em consideração quando determinamos a preferência geral a ser adotada em tomar decisões entre as opções de cuidado alternativos.

34. De acordo com Lieffard, é imperatico que as autoridades competentes exerçam algum nível de discrição ao acessar as diferentes opções e finalmente decidir qual dessas opções é provável ter o efeito desejado. O efeito intencionado é o resultado que pode ser considerado como apropriado e uma resposta adequada ao comportamento criminal da criança (LIEFFARD, 2008, p. 195).

35. Para uma discussão de pobreza no contexto da adoção internacional, veja SMOLIN (2007).

36. Por exemplo, sob o Artigo 31 do Estatuto da Criança e do Adolecente Brasileiro, adoção internacional é uma medida excepcional depois de todas as tentativas de adoção no país de origem foram exauridas e garantido então o direito da criança de viver em seu próprio país.

37. Veja a sessão “Entendendo o ‘último recurso’: Alguma lição dos princípios de justiça juvenil?” acima.

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Benyam D. Mezmur

Pesquisador, Community Law Centre, Universidade de Western Cape (UWC). Bacharel em Direito (Addis Ababa), Mestre em Direito (Pretória), Candidato a Doutorado (UWC).

Email: benyamdawit@yahoo.com

Versão Original em Inglês. Traduzido por Raquel Mozzer.


Parte da pesquisa utilizada para a composição deste artigo foi conduzida enquanto bolsista (Short Stay Fellow) do Utrecht Centre for European Research in Family Law, localizado no Molengraaff Institute for Private Law (Utrecht University). Gostaria de destacar, portanto, que o artigo contou com subsídios da pesquisa financiada pela National Research Foundation.